Os novos desafios para o mercado de (res)seguros em 2020
Após muitos avanços, expectativa do setor segurador é de dar continuidade na agenda positiva para o próximo ano
O ano de 2019 começou com a indicação da primeira mulher para o cargo de superintendente da Susep. Solange Paiva Vieira assumiu com um discurso de desregulamentação e redução de custos e barreiras às operações de (res)seguros no Brasil, dando sinais das mudanças que se confirmariam ao longo do ano. Esta agenda positiva já adentra 2020, com uma série de mudanças legais e regulatórias, que, embora iniciadas em 2019, movimentarão o mercado no próximo ano.
A começar pelo Palácio do Planalto, três importantes Medidas Provisórias agitaram o mercado. A MP da Liberdade Econômica (hoje convertida na Lei nº 13.874), que elevou a um outro patamar determinados princípios do liberalismo nos quais nosso ordenamento jurídico se baseia; a MP nº 904, que extinguiu o DPVAT; e a MP nº 905, que desregulamentou a profissão de corretor de seguros e retirou da Superintendência a competência para regular tal atividade. Recentemente, na esteira da Lei da Liberdade Econômica, a Presidência da República editou também o Decreto nº 10.139, que abre espaço para a simplificação das normas infra legais, buscando dar mais segurança jurídica e diminuir o custo de se fazer negócios no Brasil, inclusive no setor segurador.
A desregulamentação da profissão do corretor de seguros e a extinção do DPVAT foram certamente as mudanças mais polêmicas deste ano. Enquanto a extinção do seguro obrigatório está em debate no Congresso e no Poder Judiciário, tendo como foco o papel social do seguro e a necessidade ou não de um produto que o substitua (ainda que parcialmente), a desregulamentação da profissão despertou a questão do resgate do importante papel que este intermediário tem no mercado. Certos de que os corretores encontrarão seu espaço, inclusive no mundo digital, ficou para 2020 a finalização do debate sobre a transparência das remunerações percebidas por estes profissionais, cuja regra foi submetida a audiência pública, e sobre o fim da obrigatoriedade da comissão de corretagem, que, apesar de embutido na MP nº 905, já tinha sido resolvido em definitivo pela Susep no que tange às contratações por meio de bilhetes.
Ainda no campo das atribuições do chefe do poder executivo federal, em dezembro foi editado o Decreto nº 10.167, que ampliou os limites de cessão em resseguro e retrocessão a resseguradores eventuais e abriu, assim, a possibilidade de players estrangeiros revisitarem sua estratégia de atuação no mercado local e reduzirem custos regulatórios, um pleito antigo deste mercado.
Por sua vez, a Câmara dos Deputados aprovou o projeto de lei, ainda pendente de apreciação do Senado, que altera a lei de licitações. Segundo a futura regra, nas chamadas obras de grande vulto, o seguro garantia deverá prever que, em caso de inadimplemento da tomadora, a seguradora deverá exercer o step-in e finalizar o projeto. Se tais mudanças forem aprovadas, a dinâmica do seguro garantia e o papel da seguradora entrarão num novo paradigma, no qual o mercado segurador abandonará seu papel coadjuvante e passará a ser um dos protagonistas, em especial em obras públicas de infraestrutura tão relevantes para o país.
Já no âmbito específico da entidade, destacamos a restruturação interna com a criação de diretorias técnicas especializadas por linha de negócio, de forma estar mais preparada a atender as demandas de cada segmento; a possibilidade de utilização de peças novas, originais ou não, nacionais ou importadas, bem como de peças usadas para consertos de automóveis sinistrados; criação de norma sobre seguros com vigência reduzida (meses, dias, horas ou minutos) com a permissão da estruturação de seguros on demand ou intermitentes; flexibilização das regras que tratam do controle de seguradoras e afins, alinhando a regulação com estruturas de controle e governança que permitem sociedades da capital pulverizado e sem definição de controle; reconhecimento de que as seguradoras podem, mediante certos critérios, adotar cláusulas de perda de direito relacionadas a sanções e embargos; e a redução da burocracia mediante a implementação do peticionamento eletrônico, já adotado por outros órgãos da administração e pelo Poder Judiciário.
Além disso, a Susep colocou diversas normas em consulta pública, indicando mudanças regulatórias de impacto nos próximos anos: segmentação das entidades reguladas em grupos distintos para fins de aplicação proporcional da regulação prudencial, esperando-se com isto reduzir o custo regulatório especialmente para instituições de menor porte; permissão para que entidades abertas e fechadas de previdência complementar, bem como operadoras de planos de assistência à saúde, contratem operações de resseguro, permitindo a entrada de novos players neste mercado; e instituição de sandbox regulatório, permitindo que insurtechs testem seus produtos e serviços em ambiente controlado e sujeito a requisitos de capital e de compliance menos rígidos do que os aplicáveis em geral.
Estas mudanças legais e regulatórias, somadas a outras que virão em 2020, demonstram a agenda positiva traçada pelo Governo Federal e pela Superintendência, que, alinhando discurso e prática, busca dar mais liberdade, segurança, eficiência e competitividade ao mercado de (res)seguros para que ele assuma seu merecido papel como um dos motores da economia brasileira.
* Marcelo Mansur, Paula Calheiros e Roberto Panucci são, respectivamente, sócio e advogados do escritório Mattos Filho